Artigo de opinião de Tiago Preguiça, Diretor-Geral da Segurança Social
“As associações mutualistas são pessoas coletivas de direito privado, de natureza associativa, com um número ilimitado de associados, fundos patrimoniais variáveis e duração indefinida que, essencialmente, através da entreajuda e da quotização dos seus associados, praticam, no interesse destes e das suas famílias e em obediência aos princípios mutualistas, fins de auxílio recíproco de proteção social e desenvolvimento humano” (Código das Associações Mutualistas, artigo 1º).
Falar sobre o mutualismo é falar sobre as fundações da proteção social. É falar sobre entreajuda. É falar sobre os princípios fundamentais do espírito de proteção que norteia muitos dos sistemas modernos de segurança social. A responsabilidade do mutualismo, e das associações mutualistas, é, nesta perspetiva, tremenda. Manter um legado que se tornou inspiração para tantos não é tarefa pequena.
Torna-se, pois, fundamental que as associações não percam esta chama. A complementaridade à segurança social deve ser, em regra, a sua principal função. É certo que, cada vez mais, as mutualidades têm potenciado a sua ação nos domínios da cooperação, entre outros, ganhando por mérito próprio o estatuto de parceiros do setor social e solidário, simbolicamente corporizado desde a assinatura do Pacto de Cooperação para a Solidariedade Social em 1996. São várias décadas de um trabalho meritório de apoio aos mais desfavorecidos, sejam eles crianças ou os mais idosos.
Contudo, as mais de 100 associações mutualistas registadas atualmente na Direção-Geral da Segurança Social devem revisitar as suas bases. Olhar para o seu legado e reafirmarem os seus propósitos fundadores. O grande desafio para o futuro, sem nunca deixar de lado a preocupação com os mais frágeis, deve ser o de descobrir como encarar a complementaridade na proteção social, com modalidades de benefícios de segurança social, saúde e poupança que façam a diferença na vida dos seus associados.
E nem o movimento das democracias e Estados ocidentais de alargamento dos sistemas públicos de proteção social deve ser visto como um desincentivador à inovação das associações mutualistas. Numa sociedade moderna, que protege os seus cidadãos, o produto mutualista não é a rede de segurança, é sim o complemento para um futuro melhor.
Não existe, como nunca existiu, um choque entre os sistemas de segurança social e os complementos mutualistas. Existe, isso sim, uma ligação umbilical, seja ela histórica ou funcional. Aqueles que se tornaram modelos para a criação de uma das maiores conquistas da modernidade – a proteção pública dos cidadãos – são agora o seu complemento perfeito. Para isso, há que entender as necessidades e anseios das novas gerações. Há que perceber como agregar valor aos benefícios já assegurados pelos sistemas públicos.
Neste caso, como em muitos outros, o passado mostra-nos o caminho para o futuro. Ao olharmos para o melhor do mutualismo, estamos a olhar para o melhor da pessoa. Estamos a olhar para a solidariedade, para a entreajuda e para a proteção de todos.
Fica o desafio para o novo ano: pensar na complementaridade da proteção social de forma inovadora, sem nunca esquecer o caminho percorrido até aqui, com enfoque nas matérias de segurança social e saúde. Do passado conseguimos perspetivar o futuro.
Artigo originalmente publicado na Revista Mut número 13.